Em um dos movimentos mais ambiciosos de sua carreira, o artista paulistano anuncia colaboração transatlântica, um aguardado álbum de samba, uma obra literária com sua mãe, a filósofa Maria Vilani, e uma nova estrutura profissional, celebrando passado e futuro.
Poucos artistas brasileiros transitam com a mesma propriedade e urgência que Criolo entre a crônica social do rap, a profundidade melódica da canção e a reverência às matrizes do samba. Aos 50 anos, ele não apenas celebra a data, mas a utiliza como um portal. O anúncio de "Criolo 50" transcende a ideia de um mero projeto comemorativo; é um manifesto de maturidade artística, uma declaração de intenções para o futuro e uma consolidação de seu lugar como um pensador da cultura brasileira contemporânea.
"Esse projeto não é só sobre mim — é sobre todas as pessoas que me ajudaram a não desistir", afirma Criolo, convertendo um marco pessoal em um tributo à força coletiva que sustenta sua obra. A declaração encapsula a essência de uma carreira construída sobre a troca, o diálogo e a resistência.
Cartografia Sonora Transatlântica e a Dívida com o Samba
O núcleo musical do projeto é duplo e audacioso. O primeiro, um álbum em parceria com o vanguardista português Dino D'Santiago e o virtuoso pianista Amaro Freitas, sinaliza uma expansão da cartografia sonora do artista. Se a indicação conjunta ao Grammy Latino por "Esperança" foi o prelúdio, este novo trabalho promete ser o aprofundamento de uma conexão diaspórica e lusófona, um mergulho em territórios onde a ancestralidade africana se reconfigura em novas linguagens.
O segundo movimento é um gesto de profunda reverência: um disco de samba. Para um artista cuja obra é atravessada pelo gênero, a demora em lançar um álbum dedicado é, em si, uma declaração de respeito. "Levei quase 18 anos para pensar num disco. Depois, mais 10 para ter coragem de lançar", revela Criolo. Esta confissão expõe o peso da responsabilidade em dialogar com uma tradição que o formou. A expectativa é por uma obra que não apenas interprete, mas que converse com a história do samba a partir da perspectiva única de quem o viveu nas ruas do Grajaú.
O Diálogo com a Matriz: Um Legado Literário
Talvez o gesto mais radical de "Criolo 50" seja a publicação de um livro em coautoria com sua mãe, Maria Vilani. Filósofa, poeta e ativista cultural, ela não é apenas a genitora, mas a matriz intelectual e afetiva de sua visão de mundo. O livro se anuncia como um diálogo intergeracional, um encontro de saberes onde a oralidade da poesia de Criolo se entrelaça com a escrita reflexiva de Vilani. "Eu e minha mãe estudamos três anos juntos, na mesma sala. Pude enxergar ela para além da personagem mãe", conta ele. A obra promete ser um documento raro, explorando as raízes políticas, afetivas e filosóficas que nutrem o cerne de sua produção artística.
Estrutura e Catarse Coletiva: A Turnê
A materialização dessa nova fase se dará na Turnê Criolo 50, uma celebração itinerante que percorrerá o país. Com uma direção musical que promete reinterpretar seu repertório sob um olhar maduro, dos hinos de Nó Na Orelha à densidade de Convoque Seu Buda, os shows são concebidos como espaços de catarse coletiva.
Este passo monumental é sustentado por uma nova e poderosa estrutura profissional: a união da Nascimento Música, de Augusto Nascimento (lar de Milton Nascimento), com a Bonus Track, de Luiz Oscar e Luiz Guilherme Niemeyer, produtora de escala global. A aliança sinaliza não apenas crescimento, mas um novo patamar de ambição para a circulação de sua obra.
"Criolo 50" é, portanto, a coroação de uma jornada e o alicerce para a próxima. Um artista no auge de sua potência, que olha para o passado com gratidão para poder, com ainda mais força, provocar o futuro.
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