A sanfoneira, cantora e compositora baiana Lívia Mattos apresenta ao público seu novo álbum, Verve, lançado pelo selo YB Music. O disco encerra a trilogia iniciada com Vinha da Ida (2017) e aprofundada em Apneia (2022), reafirmando uma proposta estética que desafia fronteiras entre o popular e o experimental, o instrumental e a canção, a tradição e a invenção.
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| Foto: Divulgação |
Com arranjos que unem sanfona/voz, tuba (Jefferson Babu) e bateria (Rafael dos Santos), o trio — minimalista em formação, mas expansivo em sonoridades — constrói um espaço de pesquisa musical que incorpora pedais, efeitos e o estúdio como ferramenta criativa. Produzido por Alê Siqueira, que já havia assinado o primeiro álbum da artista, Verve retoma a parceria com Paulim Sartori, produtor musical de Apneia e agora co-diretor musical.
O trabalho conta ainda com participações internacionais que reforçam a dimensão cosmopolita da obra: a cantora e instrumentista indiana Varijashree Venugopal e a senegalesa Senny Camara, em uma ponte que costura Brasil, África e Ásia por meio da linguagem universal da música.
A obra de Lívia Mattos se estrutura como um arco narrativo em três capítulos. Se Vinha da Ida iluminava o frescor da estrada, celebrando descobertas, e Apneia mergulhava em densidades mais introspectivas, Verve se instala no ponto de equilíbrio — lugar de maturação estética, síntese poética e afirmação de identidade.
“Criar, aturar o que eu crio, maturar, transcriar em cima da ideia original, sem perder a espontaneidade”, define a artista, apontando para o conceito que norteia o título do disco.
A trilogia, lida em conjunto, projeta a trajetória de uma artista em movimento, que faz da vida nômade e da impermanência não apenas tema, mas condição estética.
O repertório de Verve é também um diário de deslocamentos.
- Caucaia, que abre o disco, traz um forró torto e inventivo, composto em Ceará sem sanfona à mão, no qual a voz indiana de Varijashree Venugopal encontra os timbres nordestinos.
- Em Ndoukahakro, a sanfoneira traduz em música a memória da Costa do Marfim, em diálogo com a kora e a voz de Senny Camara.
- Quanto Mais Doce evoca a ternura do amor à distância, enquanto a faixa-título Verve traduz em samba diluído o espírito criativo do trio.
- Com Você Eu Vou é uma guarânia delicada sobre o amor compartilhado, e Mundo Verde Esperança, de Hermeto Pascoal, amplia a formação para quinteto, reafirmando a ponte entre tradição e reinvenção.
- Forrógutti presta tributo a Toninho Ferragutti em um forró-choro virtuoso.
- Como Se Fosse o Mar, parceria inédita com Ivan Lins e Thais Nicodemo, mergulha nas marés da impermanência.
- História de Uma Cabeça, fruto de colaboração com Thadeu Romano, ganha videoclipe dirigido por Luiz Corrêa, que explora estética circense e humor para retratar os labirintos da mente contemporânea.
- O desfecho, Folia de Fole, celebra o carnaval baiano em um frevo que convida a ocupar as ruas.
A capa de Verve, assinada por Tiago Lima, revisita elementos visuais dos álbuns anteriores e traz pela primeira vez a sanfona em evidência. “O acordeon aparece como minha caixa de música torácica, minha máquina de respiro, meu caminho de idas e vindas do fole”, diz Lívia.
Essa escolha iconográfica reflete o que o álbum representa: a sanfona não como mero instrumento de acompanhamento, mas como organismo vivo, caixa de ressonância de uma artista que transita entre universos musicais sem fixar fronteiras.
Nascida em Salvador, Lívia Mattos é acordeonista, cantora, compositora, circense e socióloga. Com três álbuns autorais, construiu uma trajetória internacional que já a levou a festivais como Womex (Espanha), Akkordeon Festival Wien (Áustria), Accordions Around the World (EUA), FMM Sines (Portugal) e MASA (Costa do Marfim).
Como instrumentista, integrou a banda de Chico César por oito anos, colaborou com a Orquestra Sinfônica da Bahia e acumulou parcerias com Rosa Passos, Badi Assad, Vanessa da Mata, Ceumar, Johnny Hooker, Alessandra Leão e Gero Camilo.
Verve reafirma sua posição como uma das artistas mais singulares da música brasileira contemporânea, expandindo os limites do acordeon e revelando a sanfona como corpo, respiração e linguagem.
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