Para uma banda que transformou a contestação em arte, a despedida não poderia ser um sussurro. O Planet Hemp anuncia sua turnê final como um último ato de insurgência, coroando uma carreira que redefiniu os limites da música e do ativismo no Brasil.

Créditos: Wilmore

Há versos que transcendem a canção para se tornarem estandartes. "Eu continuo queimando tudo até a última ponta", entoado pelo Planet Hemp em 1997, é um desses. Nascido em uma conversa fortuita, o trecho se converteu no lema de uma legião e na síntese da trajetória de uma banda que nunca fez concessões. Agora, quase três décadas depois, essa mesma frase icônica é ressignificada para batizar "A Última Ponta", a turnê de despedida que marca o fim programado de um dos capítulos mais importantes e turbulentos da música brasileira.

Com a chancela da gigante do entretenimento 30e, o grupo iniciará seu adeus em palcos monumentais, incluindo a KTO Arena em Porto Alegre (04/10), a Farmasi Arena no Rio de Janeiro (08/11) e, simbolicamente, o Allianz Parque em São Paulo (15/11). A escolha dos locais não é trivial: para uma banda que começou tocando "para sete pessoas", como lembra o vocalista Marcelo D2, encerrar sua jornada em arenas consagradas é a materialização de um paradoxo que sempre os definiu: a alma do underground ocupando o corpo do mainstream.

"O Planet Hemp tem uma energia muito forte que não queremos que se apague", justifica D2, revelando que a decisão de encerrar as atividades vinha sendo ponderada há anos. A turnê surge, portanto, não como um fim melancólico, mas como um ato deliberado de preservação de um legado, uma última combustão controlada para que a chama não se extinga, mas se eternize em seu auge.

A ARQUITETURA DO CAOS SONORO

Para compreender a magnitude do Planet Hemp, é preciso revisitar o Brasil do início dos anos 90. Em um cenário pós-ditadura que pulsava com uma liberdade recém-descoberta, mas ainda vigiada, a banda emergiu do asfalto do Catete, no Rio, como uma necessidade histórica. A fusão sonora que criaram – uma amálgama visceral de rap, rock'n'roll, hardcore, psicodelia e ragga – não era apenas uma escolha estética, mas a própria crônica de seu tempo. Era o som da fumaça, da urgência e da confrontação.

Com o álbum de estreia, Usuário (1995), o grupo não pediu licença. Hinos como "Legalize Já" e "Mantenha o Respeito" eram mais do que músicas; eram editoriais musicados, crônicas diretas que colocaram a descriminalização da maconha e a brutalidade policial no centro do debate cultural. "Fomos vanguarda ao falar da legalização das drogas, mais que a questão medicinal, abordamos o prejuízo social que a ilegalidade traz", pontua D2. Eles não apenas criaram uma trilha sonora, eles pautaram a discussão.

A inevitável colisão com o status quo veio em 1997. A prisão dos integrantes em Brasília sob a acusação de "apologia às drogas" foi um divisor de águas. O evento, que poderia ter sido o fim, funcionou como um rito de passagem que catalisou o apoio de fãs e da classe artística, solidificando o Planet Hemp não mais apenas como uma banda, mas como um símbolo nacional de resistência e da luta pela liberdade de expressão. Longe de recuar, eles responderam com o álbum Os Cães Ladram Mas a Caravana Não Pára, ainda mais incisivo.

DO CONFRONTO À CONSAGRAÇÃO

Através de uma discografia coesa e combativa, o Planet Hemp manteve-se como uma força perene. Mesmo após um hiato de 22 anos, o retorno com JARDINEIROS (2022) foi a prova irrefutável de sua relevância contínua. O trabalho, premiado com dois Latin GRAMMYs, demonstrou uma maturidade lírica e musical que dialoga com as novas urgências do Brasil, provando que a mensagem da banda é atemporal. "O Planet tem essa coisa singular de ser uma banda underground que habita o mainstream de forma convicta, e isso vai ser levado às últimas consequências nessa tour", reforça BNegão, definindo a essência que os manteve potentes por mais de três décadas.

A turnê "A Última Ponta" promete ser uma celebração catártica dessa trajetória. D2 adianta que o espetáculo será uma versão expandida e aprofundada do recente registro ao vivo BASEADO EM FATOS REAIS, com mais tempo de palco, canções raras e a presença de convidados que foram parte fundamental de sua história. Será a comunhão final entre banda e público, a chance de testemunhar ao vivo, pela última vez, a força de uma das formações mais incendiárias da história do país.

O Planet Hemp se despede, mas seu impacto é indelével. Eles ensinaram que um microfone pode ser uma arma, que a música pode ser um manifesto e que a fumaça, por vezes, é o que torna o fogo visível para todos. A cortina está prestes a fechar, mas a conversa que eles iniciaram está longe de terminar.

SERVIÇO - PLANET HEMP: A ÚLTIMA PONTA

  • SALVADOR, BA: 13/09/2025 | Concha Acústica
  • RECIFE, PE: 20/09/2025 | Classic Hall
  • CURITIBA, PR: 03/10/2025 | Live Curitiba
  • PORTO ALEGRE, RS: 04/10/2025 | KTO Arena
  • FLORIANÓPOLIS, SC: 12/10/2025 | P12
  • GOIÂNIA, GO: 17/10/2025 | Goiânia Arena
  • BRASÍLIA, DF: 18/10/2025 | Arena BRB
  • BELO HORIZONTE, MG: 31/10/2025 | BeFly Hall
  • RIO DE JANEIRO, RJ: 08/11/2025 | Farmasi Arena
  • SÃO PAULO, SP: 15/11/2025 | Allianz Parque

Valores, horários e detalhes específicos de cada cidade devem ser consultados no site oficiail da banda.

https://www.planethemp.com.br

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